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Família nuclear (Nuclear Family)
Erin Wilkerson e Travis Wilkerson | EUA/Singapura | 2021, 96', DCP

 
O filme-ensaio abre com a definição de "espécie invasora": "Qualquer organismo vivo que não é nativo a um ecossistema e provoca mal". Em seguida, o cineasta norte-americano Travis Wilkerson relata para o espectador que, durante sua infância nas décadas de 1970 e 1980, sua mãe - uma militante política obcecada com a guerra nuclear - levava a família em viagens de carro pelos silos armamentícios presentes em todo o território estadunidense. A premissa de Família nuclear, filmado em 2019, é retomar essa viagem, numa tentativa de exorcizar os pesadelos do cineasta causados pelas recentes eleições no país. Embarcam Travis, sua esposa, a também cineasta Erin Wilkerson, seus filhos e o cachorro. Acompanhamos a família em uma jornada que reflete sobre a relação entre a história de violência dos colonos americanos contra os povos indígenas e a construção de uma cultura estruturada no empoderamento bélico. Encontramos campos vastos e vazios, que parecem ser ocupados apenas pela família de turistas acidentais, enquanto ouvimos o patriarca descrever ora uma batalha histórica realizada em um local não marcado, ora dados e notícias sobre os silos, guardados por militares que vivem isolados e em condições precárias. Esporadicamente, a tela é preenchida por fotos polaroides de flores nativas e não nativas tiradas por Erin. A trilha sonora inclui as músicas que a família escutou durante a viagem, como "Nuclear War", da The Sun Ra Arkestra, cujas letras alarmantes se transformam em um refrão melancólico.
 
O casal Wilkerson criou o coletivo Creative Agitation [Agitação Criativa] em 2009 e, por meio dele, colaborou em diversos projetos, entre filmes, videoinstalações e uma revista eletrônica de arte política. Família nuclear marca a primeira colaboração dos dois artistas na autoria de um longa-metragem. Erin possui um extenso trabalho em artes visuais, com um olhar voltado para a arquitetura e para o impacto destruidor da intervenção humana sobre a paisagem. Travis possui uma longa filmografia, focada em eventos que subvertem a história ilibada dos Estados Unidos, seu conceito de liberdade e as consequências de um sistema capitalista nocivo - muitas vezes fazendo conexões com seus próprios antepassados. Quando a família visita um fosso na cidade de Butte, em Montana (onde Travis cresceu) - considerado o primeiro grande desastre ambiental do país, consequência da exploração indevida de uma empresa de mineração do início do século XX -, ouvimos que, ano após ano, centenas de gansos morrem ao pousar nas águas superácidas do fosso. A família, ao mesmo tempo vítima e agressor, prenuncia o futuro de uma sociedade que caminha para sua autoextinção.
 
Família nuclear teve sua estreia mundial em 2021 no Festival Internacional de Cinema de Mar del Plata, onde ganhou uma menção honrosa na mostra competitiva Estados Alterados. Desde então, ele tem passado em diversos festivais, como os de Jeonju e Yamagata, e na mostra Forum, no Festival Internacional de Cinema de Berlim. Ele terá sua estreia brasileira no IMS.
 
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