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"10 Anos de Tio Boonmee, que pode recordar suas vidas passadas"
 
Apresentação escrita por Kong Rithdee, crítico de cinema do Bangkok Post e vice-diretor do Acervo Cinematográfico Tailandês (Thai Film Archive)
 
Sessão 35 mm / CineSesc / 17 de fevereiro de 2020

 
Todos os filmes de Apichatpong Weerasethakul são sobre transformação - da simples consciência ao reino do subconsciente, do homem à besta, da vigília ao sono, da luz às trevas, da lucidez à ambiguidade, da vida à doença e até à morte.
 
Mas nada está realmente morto: Apichatpong, como Andrei Tarkovsky e Béla Tarr, ou como o xamã desta parte do mundo, pratica a alquimia dos sonhos e a arte da reencarnação, onde a morte longa e não quantificável do cinema não significa um fim, mas apenas um ponto em uma roda - a roda do karma, do infinito ou a roda do rolo de filme por onde as imagens são projetadas e despertadas.
 
Com exceção de Cemitério de Esplendor, de 2015, Apichatpong filmou em película todos os seus longas-metragens. (Isso inclui o próximo, Memoria, filmado na Colômbia com Sayombhu Mukdeeprom, seu cinegrafista e colaborador de longa data, que também filmou Tio Boonmee). Para um cineasta que parece pensar muito em nascimento e morte - não literais, mas cinematográficos -, filmar em película não é apenas natural, mas também essencial para a concepção da obra. Para ele, um filme existe, e a película (significando tiras e rolos de filmes táteis e tangíveis) permite essa existência. Sem um, não existe o outro. É inevitável, é a única maneira de conceber um filme.
 
Tio Boonmee estreou em Cannes em 2010 - não acredito que já fazem 10 anos. De certa forma, o filme foi lançado no início de uma década que seria inundada por uma superabundância de imagens descartáveis, triviais e de vida curta, possibilitadas pela tecnologia digital. Tio Boonmee também apresenta um homem que estudou fotografia antes de se tornar um fantasma, e isso talvez tenha sido uma profecia, porque a fotografia, ou a cinematografia, passou por tantas transformações físicas e espirituais nos anos que se seguiram ao lançamento do filme.
 
A cada exibição, um filme ganha uma nova vida, especialmente um filme como este. Tio Boonmee pode recordar muitas vidas passadas e, nesse sentido, a platéia, sentada na sala escura para assistir à luz atomizada, irradiada através do filme, está sempre em harmonia com ele.
 
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